Um homem com registro de Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador (CAC) e um ex-policial militar são considerados foragidos pela Polícia Federal, após uma operação prender 19 pessoas suspeitas de envolvimento em um esquema multimilionário de venda ilegal de armas de fogo desviadas na Bahia, Pernambuco e Alagoas.
As investigações apontaram que o esquema, que envolvia policiais militares, comerciantes e CACs, tinha participação de laranjas.
A operação Fogo Amigo, comandada pela PF da Bahia, apreendeu:
-15 pistolas;
-seis fuzis;
-duas espingardas;
-dois revólveres;
-25 mil munições.
O g1 entrou em contato com a defesa dos dois acusados, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.
Dez dos 19 presos são policiais
Dez das 19 pessoas presas na operação eram policiais. Um dos investigados pela Polícia Federal foi um sargento da PM de Petrolina (PE), que movimentou, segundo o Coaf, aproximadamente R$ 2,1 milhões em um período de pouco mais de seis meses entre os anos de 2021 e 2023.
O valor foi considerado pelas investigações como totalmente incompatível com os seus rendimentos de sargento da Polícia Militar.
Ainda de acordo com um dos investigados, que firmou acordo de delação premiada, o grupo comandado por este sargento da PM chegava a vender cerca de 20 armas de fogo por mês.
O sargento é apontado como o principal fornecedor de armas e munições do esquema. Para um dos compradores, ele enviou 36 caixas com mil munições, o que daria uma média de 2.250 munições por mês.
Operação Fogo Amigo
Durante a operação, também foi determinado o sequestro de bens e bloqueio de valores de até R$ 10 milhões dos investigados, além da suspensão da atividade econômica de três lojas de venda de material bélico.
Até a última atualização desta reportagem, foram cumpridos:
-Juazeiro (BA) – quatro mandados de prisão e seis de busca e apreensão;
-Santo Antônio de Jesus(BA) – um mandado de prisão e outro de busca e apreensão;
-Porto Seguro(BA) – um mandado de prisão e outro de busca e apreensão;
-Lauro de Freitas (BA) – dois mandados de prisão e dois de busca e apreensão;
-Salvador (BA) – sete mandados de prisão e 11 de busca e apreensão;
-Petrolina (PE) – três mandados de prisão e nove de busca e apreensão;
-Sanharó(PE) – um mandado de busca e apreensão;
-Arapiraca(AL) – um mandado de prisão e dois de busca e apreensão.
As investigações apontaram que ele vendia 10 mil munições ilegais por mês. A reportagem tentou contato com a defesa do suspeito mas não conseguiu até a última atualização desta reportagem.
Em uma casa em Salvador, a força tarefa encontrou mais de 400 munições de fuzil. O dono do arsenal ilegal foi preso agora em Petrolina.
Segundo fontes da força tarefa, também foram apreendidos dezenas de celulares e computadores. O material vai passar por perícia, para permitir identificar mais suspeitos de integrar o esquema criminoso de desvio de armas para facções criminosas.
Participa da operação mais de 300 Policiais Federais, grupos táticos da Polícia Militar da Bahia, Polícia Militar de Pernambuco, além de promotores do Gaeco da Bahia, Gaeco de Pernambuco e integrantes do Exército.
A decisão judicial que autorizou a operação diz que a quebra de sigilo telefônico e telemático dos investigados apontou de forma clara uma organização criminosa especializada no comércio ilegal de armas de fogo, munições e itens balísticos, constando que armas de fogo de uso restrito, como fuzis e espingardas calibre 12 semiautomáticas, também são negociadas pelo grupo criminoso.
Ainda segundo as investigações, esses armamentos são utilizados frequentemente em assalto a carros fortes e instituições financeiras, além de serem empregados em ações denominadas domínio de cidades, modalidade conhecida como “novo cangaço”.
Práticas criminosas
A decisão judicial aponta uma operação de compra e venda de munições que utiliza diversos agentes, incluindo policiais, donos de lojas de armas, vendedores e responsáveis pelo envio do material ilegal.
Segundo a investigação, uma das práticas comuns envolve a falsificação de Certificado de Registro de Arma de Fogo (Crafs) para obtenção de armamento em lojas regulares. Veja, abaixo, algumas das funções dos investigados na organização criminosa:
-Um dos investigados, segundo a PF, agia ao lado da companheira e era responsável pelo envio de armas de fogo para as cidades de Eunápolis, Porto Seguro e Juazeiro. Ele fez 25 transações via pix, que somaram R$ 77.150,00 e sua companheira transferiu R$ 108.910,00 em apenas 65 dias para o comerciante de armas;
-relatório do Coaf aponta que um policial militar investigado movimentou R$ 2,1 milhões. Quebra de sigilo de dados telemáticos apontam que ele comprou armas e munições em Salvador;
-outro alvo aparece como fornecedor de munições de fuzil 556 e fuzil 762;
-um proprietário de loja bélica de Arapiraca (AL) recebeu cerca de R$ 700 mil em um ano de um dos investigados pelo tráfico de armas. Segundo a investigação, a compra de munição ilegal do empresário ocorre há, pelo menos, três anos;
-já os proprietários da loja Universo Militar de Juazeiro (BA) foram apontados também como comerciantes ilegais de armas e munições. Segundo o colaborador relatou, um vendedor da loja – também alvo da operação – incluía os dados de diversos Crafs informados pelo contrabandista e dava baixa no sistema como se a compra fosse feita pelo possuidor do registro, quando na verdade era adquirido pela organização criminosa. Os proprietários, segundo a PF, orientavam sobre como driblar a fiscalização do Exército.
A decisão judicial explica ainda que o colaborador da PF informou que “desejava adquirir armamento ilegal para distribuição em facção criminosa, se dirigia aos estabelecimentos e adquiria, livremente, o artefato que era inserido pelo funcionário na loja em nome de comprador fictício, alguns deles, conforme comprovado, sequer possuíam armas registradas em seu nome”.
Suspensão de lojas
Foi definida a suspensão das atividades econômicas das lojas Sport Tiro e Comecial Taurus. Segundo a decisão, os estabelecimentos “por meio de prepostos e sócios, facilitaram sobremaneira a circulação de armas e munições ilegais com inserção de dados fictícios referentes aos respectivos compradores”.
Os investigados responderão pelos crimes de organização criminosa, comercialização ilegal de armas e munições, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica, com penas somadas que podem chegar a 35 anos de reclusão.
A operação foi denominada “Fogo Amigo”. De acordo com a PF, o nome faz alusão ao fato de que os policiais integrantes da organização criminosa vendem armas e munições de forma ilegal para criminosos faccionados e que acabam sendo utilizadas contra os próprios órgãos de segurança pública.
Fonte G1