A manicure denunciada pela ialorixá Mãe Iara D’Oxum por intolerância religiosa em um salão de beleza dentro de um shopping no bairro de São Cristovão, em Salvador, nega ter cometido o crime. O caso aconteceu na sexta-feira (24).
Segundo a funcionária do estabelecimento comercial, que preferiu não revelar a identidade, a ialorixá chegou no local, aplicou um produto no cabelo, pegou a bolsa e disse para a recepcionista que iria sair.
“Quando finalizei um atendimento, ela seria a próxima. Perguntei na recepção onde estava a próxima cliente e ela não estava no salão”, contou.
De acordo com a manicure, uma outra cliente chegou no salão de beleza e disse que queria pintar as unhas dos pés e das mãos.
“Fui até a senhora, recepcionei, coloquei ela sentada e disse que faria o serviço dela. Pedi licença, disse que ia no banheiro e retornaria. Quando retornei, dona Iara já estava no salão”, disse a denunciada.
Ainda segundo a manicure, a ialorixá percebeu que não seria atendida pela funcionária, pegou o celular, fez um gesto de que iria gravar um vídeo dela e disse a funcionária teria cometido intolerância religiosa e preconceito pela cor dela.
“Disse que por ela estar na sexta-feira vestida de branco, eu não queria atender ela, e que eu, negra, estava dando preferência a uma senhora branca”, relatou.
“Me xingou, filmou, disse que não iria me processar porque eu não teria dinheiro para pagar e disse que eu era preta, suja, imunda e vários outros xingamentos”, acrescentou a manicure.
Em seguida, de acordo com a manicure, Mãe Iara D’Oxum seguiu no salão de beleza, onde terminou o serviço que tinha começado no cabelo. Foi aí que o advogado da ialorixá e dois policiais militares chegaram no local.
“Me chamaram para ouvir minha versão junto com a dela, mas não sei de onde ela tirou essa intolerância religiosa. Ela não sabe da minha religião. Tenho amigos, familiares e clientes da religião do Axé, que eu respeito, independentemente da cor”, ressaltou.
“Atendo aqui de segunda a domingo, pode vir de preto, branco, azul, amarelo, do que quiser”.
Denúncias da ialorixá
A líder religiosa divulgou um vídeo em que conta que uma funcionária do estabelecimento se recusou a atendê-la porque ela estava usando vestes características de religiões de matriz africanas.
No vídeo, compartilhado nas redes sociais, Mãe Iara traz detalhes do episódio.
“Todo mundo me olhando como se eu tivesse roubado, matado. Foi horrível. Uma sensação de impotência”, relatou.
Em outro momento do vídeo, a líder religiosa contou que tinha ido ao salão fazer a unha, mas que a manicure teria dito “eu não faço a unha disso aí”, e em seguida teria chamado ela de macumbeira.
“Ela vira e pega a unha de uma branca na minha cara”, acrescentou.
A Polícia Civil informou que a ocorrência foi registrada como racismo na 12ª Delegacia Territorial (DT/Itapuã), e que a suspeita esteve na unidade policial neste sábado (25), acompanhada de um advogado, onde prestou depoimento e negou o ocorrido.
De acordo com a PC, a suspeita afirmou que está sendo perseguida e ofendida por outras pessoas, por conta da acusação.
A nota da Civil diz ainda que as partes serão ouvidas novamente na delegacia e testemunhas devem ser intimadas.
A Polícia Militar informou que policiais da 49ª CIPM foram acionados para averiguar informação sobre um desentendimento em um shopping. A nota da corporação informa que com a chegada dos PMs, a Ialorixá e a funcionária do salão apresentaram suas versões, acompanhadas por seus respectivos advogados, e informaram que realizariam o devido registro de ocorrência.
Na tarde de sábado (25), um grupo de pessoas acompanhou a ialorixá em um protesto dentro do shopping contra o ato de intolerância religiosa. Os manifestantes aparecem nas imagens vestidos de branco e tocando atabaques.
Sobre o protesto, o shopping informou, por meio de nota, que não compactua com nenhum tipo de preconceito e atuou para que ato religioso fosse respeitado e transcorresse de forma pacífica. Sobre o episódio da sexta-feira que motivou a manifestação, o estabelecimento afirmou que a o salão deveria ser procurado.
Salão nega intolerância religiosa
Em entrevista à TV Bahia, o advogado do salão de beleza, Marcelo Sotero, disse que não se trata de caso de intolerância religiosa. Ele contou que, de acordo com informações passadas pelo seu cliente, a ialorixá Mãe Iara D’Oxum já estava sendo atendida pelo salão onde fez o cabelo.
Em seguida, a Mãe Iara D’Oxum teria solicitado o serviço à manicure, mas teria saído para fumar. No retorno, uma outra cliente estava sendo atendida. Ainda de acordo com o advogado, a manicure disse que o salão estava cheio e por isso começou a atender outra cliente achando que Mãe Iara D’Oxum iria demorar.
O advogado disse ainda que quando a ialorixá voltou é que teria feito as acusações contra a manicure, alegando que ela estava se recusando a atendê-la por conta de intolerância religiosa.
Em nota, a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial e dos Povos e Comunidades Tradicionais (SEPROMI) informou que acionou a rede de combate ao racismo e à intolerância religiosa do estado e se colocou à disposição para atender à ialorixá.
A SEPROMI disse ainda que a líder religiosa será atendida pela Coordenação Especializada de Repressão aos Crimes de Intolerância e Discriminação (COERCID) da Polícia Civil nesta seguda-feira (27).
Fonte G1 Bahia