O morador da Chácara São Cosme Ocean Silva Galvão, 29 anos, que é enfermeiro e especialista em Gestão de Saúde Pública, vem observando o aumento de casos de esporotricose em diversos bairros de Feira de Santana.
De acordo com ele, em entrevista ao Acorda Cidade, a infecção estaria presente em bairros como Chácara São Cosme, Feira X, Jardim Cruzeiro e Capuchinhos. O enfermeiro reclama que existe uma demora do Centro de Zoonoses de resgatar esses animais infectados e há falta de conscientização por parte da prefeitura, identificando, isolando o animal e tratando-o, por ser uma doença fortemente transmissível.
“Acredito que isso está fazendo a doença progredir em vários gatos. Por exemplo, teve um gato que estava com esporotricose, chamamos o Centro de Zoonoses e eles disseram que iriam vir resgatar. Demorou uma semana e o gato ficou cheio de feridas, e já tinham outros gatos que andavam junto com ele que estavam apresentando a doença também. Essa doença tem tratamento, que pode durar de três a quatro meses. Se o ser humano for mordido ou arranhado por um animal infectado também pode contrair a doença”, afirmou.
Ele destacou que, em sua maioria, os animais de rua estão mais suscetíveis à doença, por entrarem em contato com solo contaminado, mas os domésticos também pode contrair, no caso do semidomiciliares.
“Percebi que doença estava se alastrando primeiro pelas reportagens e segundo pelos gatos que têm aparecido aqui no bairro, mas também tenho conhecidos em outros bairros que estão passando pela mesma situação, a exemplo de uma casa no Conjunto Feira X que a proprietária tinha quatro gatos. Ela abandonou os animais, se mudou da casa, e agora o imóvel conta com mais de 20 gatos e estão todos com esporitrocose. O Centro de Zoonoses esteve lá, resgatou dois ou três e deixou o restante lá, sendo que todos estão com a doença. Sempre que recorremos não tem medicação e não tem como virem resgatar”, afirmou Ocean Silva.
Ele esclareceu que a esporotricose é uma doença fúngica, que pode atingir animais que mexem com o solo, a exemplo de gatos e cachorros, e até seres humanos.
“A sintomatologia da esporotricose é basicamente o aparecimento de úlceras em todo o corpo do animal e também o aparecimento de feridas internas, que comprometem logo o sistema respiratório e podem levar os animais gato e cachorros a óbito em questão de semanas. No ser humano também aparecem os mesmos sintomas, só que não é fatal. A transmissão da doença é pela arranhadura, mordedura e também por compartilhamento do ambiente. Por exemplo, se o gato ou cachorro tiver uma ferida e o solo estiver contaminado, ele pode vir a desenvolver. Os principais sintomas são as feridas pelo corpo, ou as chamadas úlceras, que podem aparecer no focinho, cabeça, patas, barriga, e quando o gato está em estágio terminal elas aparecem por todo o corpo, inclusive por dentro do animal”, explicou.
Conforme Mirza Cordeiro, coordenadora do Centro de Zoonoses de Feira de Santana, o município viveu um surto de esporotricose em 2022, mas ainda convive com casos da doença.
“Em Feira de Santana já houve um surto, que é um número elevado de casos de uma doença, um agravo não esperado. Agora a gente tem muitos casos ainda da doença, porque infelizmente a gente ainda tem muitos animais errantes e semidomiciliados. Animal errante é aquele que fica solto em vias públicas, e semidomiciliados são aqueles que estão no domicílio e vão às ruas também. Então em função desses dois fatores, a gente tem a manutenção da doença, e quando a gente recebe a denúncia da esporotricose, quando é um bairro que não tem casos, a gente faz a busca ativa, ou seja, a gente vai ao local onde aconteceu a chamada e fazemos um raio de ação pelos quarteirões para identificar se existem casos de esporotricose naquele local. Existindo, a gente vai dar as medidas preventivas que são orientadas pelos técnicos de Feira de Santana”, informou a veterinária.
Ela destacou que, quando existem animais errantes infectados com a esporotricose, os técnicos do Centro de Zoonoses são orientados a recolher para o órgão.
“Quando a gente não consegue, a gente orienta as pessoas que dão alimentos para tentarem administrar medicações àqueles animais. A gente fornecia a medicação, fizemos uma despensa de urgência, só que foram muitos casos e o pedido acabou rápido. Já solicitamos da Secretaria de Saúde outra demanda de medicamentos e estamos aguardando. Existia uma doença que não tinha casos e quando a gente foi verificar era algo muito maior do que realmente a gente esperava. Por isso pedimos mais medicação para a gente tratar aqueles animais errantes. A gente não faz tratamento de animais que tenham proprietários. Nós só fazemos de animais errantes ou que estejam internados no Centro de Zoonoses, que neste momento nós temos”, informou Mirza Cordeiro.
A coordenadora do Centro de Zoonoses falou ainda sobre a situação da Chácara São Cosme, onde os moradores têm reportado muitos casos.
“A Chácara São Cosme foi um dos primeiros locais que nós tivemos chamados de animais com esporotricose. Estamos tentando sempre atender a população da melhor forma possível. Já fomos várias vezes ao local, já estivemos nas casas, recolhemos animais, mas a gente tem uma padronização do atendimento e tem coisas que não podemos fazer, como abrigar animais sadios ou com suspeita no Centro de Zoonoses, sem ter certeza. Existem dois tipos de reconhecimento, que são exames laboratoriais e o clínico e epidemiológico. A esporotricose é uma doença para o animal que é muito grave, porque além das feridas externas visíveis, ela chega a um ponto que o animal fica com problemas respiratórios em função do comprometimento pulmonar”, observou.
No ano passado, 940 atendimentos de esporotricose foram realizados pelo Centro de Zoonoses.
“Nós recolhemos para o Centro de Zoonoses 52 animais errantes, fizemos busca ativa de 481 animais com positividade. O que dificulta nosso trabalho e somos muito questionados é com a alimentação de animais nas ruas. E isso realmente a gente tem um problema sério, porque atrai os animais, que terão convívio, e a gente vê que há uma disseminação da doença. Para se ter uma ideia, no mesmo período do Jardim Acácia, tivemos no Jardim Cruzeiro, e lá não tinha essa característica de colocar alimentos na rua para os animais. No Jardim Cruzeiro, já não temos mais casos de esporotricose, foi debelado, ou seja, a gente conseguiu fazer com que as pessoas entendessem que os animais não podem ficar soltos em vias públicas, as pessoas não alimentam os animais, e a gente não tem nenhum chamamento ou ordem de serviço por agora do Jardim Cruzeiro. Nos Capuchinhos, começou, mas diminuiu bastante”, pontuou.
Segundo Mirza Cordeiro, a parte animal é com o Centro de Zoonoses, mas quando pessoas têm a doença, a parte humana, existe uma rede fechada.
“O Centro de Zoonoses comunica à Viep (Vigilância Epidemiológica) e a gente encaminha para o Centro de Infectologia esse paciente, que é acompanhado. Então a gente se cercou de todas as maneiras possíveis para a gente não ter um avanço dessa doença. A gente teve uma demanda muito grande no início do ano passado e este ano já temos um número menor.”
Outra situação que levanta dúvidas na população é com relação à prática da eutanásia em animais. Mirza Cordeiro esclareceu que ela só acontece quando determinado animal não responde ao tratamento.
“Uma coisa que a população fala é que o animal entra no Centro de Zoonoses e vamos matar. Mas o órgão é para controlar as zoonoses e existe dentro do nosso escopo, dentro da legalidade, uma portaria que permite ao médico veterinário fazer a eutanásia quando mostrar que tem um protocolo pertinente para esse fato. Nós não matamos, nós fazemos a eutanásia de uma forma legal e humanizada, dentro dos protocolos que são permitidos pela portaria e só fazemos o procedimento quando o animal não responde ao tratamento de esporotricose.”
Fonte Acorda Cidade