O Senado aprovou nesta terça-feira (20) o projeto que acaba com a saída temporária dos presos, conhecida como “saidinha”, em feriados e datas comemorativas, como Dia das Mães e Natal.
Foram 62 votos a favor, 2 contrários e uma abstenção. O governo liberou a bancada para votar como quisesse.
A proposta só permite a saída se o detento for estudar, fazer um curso supletivo, por exemplo.
O texto ainda precisará passar por uma nova votação na Câmara. Só depois de aprovado pelos deputados é que o projeto poderia virar lei.
O projeto é resultado de uma pressão dos parlamentares de oposição, que argumentam que detentos aproveitam a saidinha para fugir da cadeia e praticar outros crimes.
A discussão no Congresso para restringir as saídas temporárias vem desde 2013. A proposta ganhou força depois de o policial militar Roger Dias ser morto por um preso beneficiado pela saidinha em Belo Horizonte, em janeiro.
O relator do projeto, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), inclusive sugeriu que, se o texto virar lei, deve levar o nome “Sargento PM Dias”. Welbert Fagundes, acusado de matar o PM, foi preso novamente e cumpre agora a pena em regime fechado.
Segundo levantamento realizado pelo g1, a saída temporária de Natal de 2023 – a mais recente concedida – beneficiou pouco mais de 52 mil presos. Desses, 95% (49 mil) voltaram às cadeias dentro período estipulado. Os outros 5% (pouco mais de 2,6 mil), não.
Em entrevista à Globo News, o senador Izalci Lucas (PSDB-DF) defendeu o projeto.
“Hoje está muito liberal. As pessoas estão saindo… grande parte volta, mas tem um percentual razoável que continua não voltando, praticando crime, praticando assassinato, e a gente precisa proibir isso definitivamente”, disse.
Quem tem direito ao benefício
Hoje a saidinha beneficia aqueles que estão no regime semiaberto — que passam a noite no presídio, mas podem sair para estudar ou trabalhar. Vale para o preso com bom comportamento, que tenha cumprido 1/6 da pena se for primário e 1/4 se reincidente. O benefício contempla pessoas que não cometeram crimes hediondos ou graves, como assassinato.
A saída temporária permite que o detento realize:
visitas à família;
cursos profissionalizantes, de ensino médio e de ensino superior; e
atividades de retorno do convívio social.
Geralmente, não há vigilância dos presos que saem, mas, se achar necessário, o juiz pode determinar uso de tornozeleira eletrônica. O projeto, portanto, exclui a possibilidade de o preso visitar a família e participar de atividades para reinserção social.
O texto mantém a possibilidade da saída para realização de cursos. A sugestão foi do senador Sérgio Moro (União-PR), para quem esta possibilidade já contará como forma de reintegração social.
Críticas à proposta
Para especialistas ouvidos pelo g1, a proposta pode atrapalhar a ressocialização dos detentos.
Nota técnica divulgada na sexta-feira (16) por 66 entidades, incluindo o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), avalia que a proposta “trará enorme impacto financeiro para a União e para os estados” e vai “agravar ainda mais” índices de violência.
Já a Justa — que faz parte das 66 entidades que assinam a nota — realizou em 2022 levantamento que mostra que estados brasileiros gastam, em média, R$ 4.389 com policiamento, mas reservam apenas R$ 1 por preso com políticas exclusivas para ressocialização de presos.
“A extinção da saída temporária iguala o regime semiaberto ao regime fechado, ferindo o princípio da individualização das penas e colocando fim ao retorno gradual da pessoa presa ao convívio social e familiar, o que certamente trará impactos sociais negativos”, diz a nota.
“Não bastasse, o projeto poderá ter um impacto significativamente deletério para a administração prisional, na medida em que a pessoa em cumprimento de pena, sem perspectivas de visitar a família, progredir de regime ou manter-se em regime intermediário, não terá nenhum incentivo a respeitar as regras do direito penitenciário”, conclui.
O projeto também foi criticado à época de sua aprovação pela Comissão de Segurança Pública do Senado. Para o Grupo de Trabalho Interinstitucional de Defesa da Cidadania — que reúne o Ministério Público Federal (MPF), defensorias públicas (inclusive da União) e entidades da sociedade civil — o projeto é “flagrantemente inconstitucional”.
“As chamadas “saidinhas” são um importante instrumento de ressocialização e reconstrução dos laços sociais, fortalecendo os vínculos familiares e contribuindo para o processo de reintegração social da pessoa em privação de liberdade”, diz o texto do comunicado.
Fonte G1